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Logradouro também é patrimônio histórico


Em 2017 escrevi um artigo sobre a importância dos nomes de ruas da cidade. Artigo esse publicado também no jornal Folha do IHGC, nº11, Ano IV – 12 de dezembro de 2017.

Naquele ano um livro sobre os logradouros públicos caxienses ainda era um projeto em desenvolvimento. Agora que o projeto do livro ‘Por Ruas e Becos de Caxias’ se tornou realidade, onde a população – e o meio político - vai ter oportunidade de conhecer os motivos que levaram determinada figura, data ou nome pitoresco a ser homenageada com um espaço urbano. E mais importante, que se preserve aquele local de memória.

Segue abaixo o artigo para que o leitor entenda a importância deste trabalho e de nossa história:

O trato com o bem histórico caxiense vem sendo tratado de forma desleixada e sem interesse há muito tempo. Os bens materiais que compõe o acervo arquitetônico e que vem sofrendo agressões no dia a dia é o mais perceptível. Talvez por serem objetos materiais, palpáveis ao cotidiano. Os antigos casarões e seus elementos sendo apagados de nossas ruas de forma grosseira em favor de uma ‘nova paisagem’, na maioria das vezes de estilos e formas bem duvidosas.

Mas um dos nossos bens culturais que também estão sendo apagados nessa leva são os antropônimos e topônimos de nossos logradouros públicos.

Um logradouro público é muito mais do que uma rua ou praça. Tratando da parte central da cidade, a rua é traço inicial de muitas histórias e tradições no nosso meio político, social e cultural. Quer seja pela instalação de uma casa comercial aumentando sua valorização mobiliaria, uma residência de família expandido sua ramificação e influencia na localidade ou um teatro, trazendo artistas, contos e grupos para suas esquinas.

A esses lugares deram suas identidades próprias. Nomes que fazem parte de um universo único, originados daquele lugar particular. E são essas ações representativas que se criam o aspecto cultural e imaterial de uma localidade.

Ruas, travessas, becos e praças que homenageiam figuras do meio caxiense e datas simbólicas de nossa história estão sendo trocados por nomes de pessoas falecidas recentemente, onde na maioria residiam na rua ou proximidades.

Não que essas pessoas não sejam merecidas de honrosa homenagem. Sou até favorável a mudança do nome de um logradouro tradicional. Desde que o futuro homenageado tenha sua biografia tão ou mais destaque e importância que o atual a ser trocado. Que a sua história se sobressaia a uma data comemorativa ou a um nome popular.

Existem mais de mil logradouros públicos em Caxias e dezenas de nomes que se repetem pelos diversos bairros. Essas ruas e travessas é que devem receber essas novas homenagens ao invés de alterar becos e ruas tradicionais caxienses.

A origem dos nomes de nossas ruas

Ao se estabelecer o traçado viário e a delimitação dos quarteirões na então Caxias das Aldeias Altas do século XIX, deu-se nomes ligados aos templos religiosos, ao comercio, seus aspectos sociais e também ao urbanismo português. Rua Direita é um termo bastante usado nas vilas e cidades portuguesas que definem uma via estrutural. Em Caxias por volta de 1845 a Rua Direita era o nome da rua em que residiu o poeta Gonçalves Dias, e que também já se chamou Rua Formosa, Benedito Leite, do Cisco e hoje Fause Elouf Simão.

Nomes de logradouros que se repetiam nessas cidades de origem portuguesa como: Rua Augusta, Rua Norte, Rua Sul, Rua das Flores, Rua Grande, da Palma e largos como Matriz, da Cadeia, da Independência também existiam em Caxias.

A via que se mantinha o Porto para navegação, ganhou esse nome – Rua do Porto Grande. Locais que aglomeravam comerciantes não eram diferentes. A Rua dos Barbeiros mantinham esses profissionais com serviço de barba, cabelo e bigode. Aos poucos essas nomenclaturas foram mudando.

Grande parte dos logradouros públicos de Caxias na sua área central são nomes de personalidades homenageadas ainda em vida. Até o fim do século XX essa medida era bastante comum. Alguns merecidos como o poeta Coelho Neto que foi homenageado pela Câmara Municipal no ano de 1899 com o seu nome dado a rua em que nascera – Rua da Palma - e que permanece até os dias de hoje.

Mas a maioria eram de chefes políticos que ditavam a política na cidade e no Estado. Benedito Leite, Urbano Santos e Godofredo Viana receberam nomes no período do início republicano. A Revolução de 30 também nomeou ruas com seus chefes, como Getúlio Vargas e Siqueira Campos. O período da Ditadura Militar (1964-1985) não foi diferente: Sarney, João Castelo, Geisel e outros iam batizando as novas áreas periféricas urbanizadas na cidade durante esse período.

Mesmo com a proibição de logradouros públicos com nome de pessoas vivas pela Lei Complementar Nº 01 de 09/11/1967 e Lei Federal Nº 6.454 de 24/10/1977, as ruas de Caxias continuaram sendo batizadas com o de pessoas vivas até início do século XXI. Nos últimos anos, de forma bem lenta, esse costume vem sendo abolido. Mas não por completo. As homenagens nas ruas a políticos agora vem por meio de seus familiares.

Nomes históricos alterados

O chegar aqui o Decreto de 1990 que estabeleceu o perímetro de interesse histórico, nele também deveria permanecer além do acervo o nome de seus logradouros. Mas não foi o que aconteceu. Várias ruas do centro histórico que tinham nomes ou datas alusivos à nossa cultura tiveram o seu nome alterado.

A rua Benedito Leite foi uma das primeiras a gerar estranheza por parte da população. Nome quase centenário e de traçado mais antigo ainda, a rua é mais conhecida por ser o local em que residiu o jovem Gonçalves Dias. Embora o seu nome tenha sido alterado a mais de dez anos para o atual, poucas pessoas a conhecem por seu nome atual.

A Rua 01º de Agosto, data histórica e festiva para a cidade, símbolo de nossa luta pela independência não existe mais. Foi nomeada para rua Alderico Silva, importante comerciante na metade do século XX.

A tradicional Praça Candido Mendes também passou recentemente pelo perigo de ter o seu nome alterado. Candido Mendes de Almeida, fundador do primeiro jornal em Caxias, Deputado e Senador pelo Império além de jornalista e advogado. Dá nome a uma das maiores universidades brasileira situada no Rio de Janeiro. Embora nascido em Brejo, aqui residiu (em um imóvel em frente a Praça que leva seu nome). Esse grande maranhense por pouco não fora também deixado de lado. A mudança seria para Praça Padre Mendes, em homenagem ao padre falecido em 2015 e que por muitos anos foi vigário da Igreja da Matriz. Cessado o impacto emocional da perda do padre, a tentativa de mudança foi suspensa, pelo menos por enquanto.

A última tentativa de alterar um nome histórico foi no bairro Cangalheiro. A Rua do Fio foi um dos primeiros caminhos abertos naquela localidade e que fora modelada ao longo do tempo como rua. Recebeu esse nome pois era por ali que passava o fio do telegrafo no século XX. Em 2016 um vereador apresentou projeto para alterar seu nome para ‘Rua Dirceu’, em homenagem ao comerciante Dirceu Mário Baima Pereira que mantinha comercio na região e que se popularizou em um pequeno largo que foi chamado de ‘Pau do Dirceu’. A população local não gostou da ideia e entrou com um abaixo assinado contra a mudança do nome da rua. A Câmara acabou acatando o pedido da população evitando a mudança de seu nome. Mas isso não evitou que placas com o nome Rua Dirceu fossem confeccionadas e fixadas, permanecendo até hoje.

Nomes populares como Rua do Fio são expressão da popularidade local. Existe uma carga muito forte de valores culturais exclusivos de certas regiões. O bairro Trizidela não fora batizado ao acaso. Historiadores são unanimes em afirmar que esse termo nasceu graças a população indígena naquela localidade. Este bairro de Caxias acabou servindo como denominação de áreas urbanas situadas na outra margem de rios que cortam uma cidade, inclusive batizando cidades como Trizidela do Vale.

O nome Rua do Fio por exemplo, serviu como base para diversas ruas na cidade nos bairros periféricos em que passam os fios de alta tensão da rede elétrica. Atualmente entre ruas e travessas existem 17 logradouros públicos com o nome ‘do Fio’ em Caxias.

É preciso um verdadeiro projeto de preservação da nossa história. A mudança do nome de um logradouro público não pode ficar apenas em votação pela Câmara. Deve passar pelo crivo de um Conselho ligado ao patrimônio histórico, da história, da cidade. Elaborado e fiscalizado por pessoas capacitadas nessas áreas.

É necessário que os nomes das ruas que compõe o centro histórico de Caxias tenham seus nomes de volta. Essa atitude faz parte de nossa preservação. A onomástica caxiense merece sim ser recuperada e estudada.

Deve-se ter de volta os nomes do Beco da Estrela, da Mangueira, da Pólvora, do Galo, do Noronha, do Onze, da Usina. Da rua Benedito Leite (ou Rua do Cisco), a rua 1º de Agosto, Conselheiro Sinval (ou Porto Grande), da Tangerina e todas as vias significativas da malha urbana do centro histórico.


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