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Precisamos de mais museus


O produto de tantas substâncias, das mais variadas artes produzidas em Caxias, parecem encontrar ecos em diversas cidades pelo Brasil, menos aqui. Somos produtores natos nos campos das letras e da cultura em geral. A matéria prima transborda nessas margens do Itapecuru criando um campo fértil, rico para a extração de conhecimento, mas falha na sua produção e pior ainda, na finalização desse processo que é seu usufruto. Não temos museus que merecíamos ter.

Nos destacamos como potência econômica no século XIX como produtores de arroz, cana de açúcar e posteriormente no babaçu exportando para os grandes centros urbanos, até mesmo para Europa e Estados Unidos. E foi na instalação do nosso parque industrial, com a fabricação de nossos produtos por nossa mão de obra, que chegamos a plenitude econômica. Foi a visão empreendedora de nomes como Francisco Dias Carneiro que a cidade passou de fornecedora dessa matéria bruta para fornecedora de produtos finalizados pelos caxienses. E produto de primeira qualidade como atestavam.

Mas se não conseguimos manter o poderio econômico, nossa outra matéria natural continuou minando de forma espetacular. Qual outra cidade tem orgulho de ser intitulada como ‘cidade dos poetas’? Qual outra cidade tem o orgulho de ter em dois dos quatro Símbolos Nacionais, o Hino e a Bandeira (três se consideramos o Selo Nacional – que é a esfera da bandeira com o lema Ordem e Progresso), dois de seus ilustres filhos – Gonçalves Dias e Teixeira Mendes? Qual cidade brasileira, excluindo as capitais, tem dois de seus cidadãos Patronos da Academia Brasileira de Letras (Gonçalves Dias e Teófilo Dias) além de Caxias? A resposta é nenhuma.

No Maranhão, Caxias foi pioneira em diversos ramos, inclusive saindo a frente da capital, como a primeira a ter seu parque industrial (1883) e a primeira a ter sua linha férrea intermunicipal (inaugurada em 1895). São Luís só teria a sua primeira fábrica em 1890 (Caxias já tinha três). A estrada de ferro só chegaria a capital maranhense em 1919 quando a linha de Caxias foi estendida ligando as capitais do Maranhão e Piaui. Ainda assim só chegaria de fato para a população ludovicense com a construção da ponte metálica sobre o Estreito dos Mosquitos (Ponte Benedito Leite) em 1928. A imprensa aqui nas terras caxienses apareceria em 1833, a segunda cidade da então Província maranhense. Na virada do século XIX para o XX, foi Caxias nesse período rico de sua economia industrial, absorvendo as novas tecnologias pouco tempo depois da capital: o telefone, o sistema de transporte por bonde, a água encanada e a energia elétrica.

Industrialização, transporte, artes, letras e histórias de luta. Tudo aqui em Caxias. E aonde estão os espaços na cidade para contar essas histórias para seu cidadão e as novas gerações? E esses espaços que servem como narrativas da história são os museus.

O único museu atualmente existente em Caxias é o Memorial da Balaiada. Assentado onde antigamente estava parte do Quartel da Policia, o Memorial está em um espaço de dois dos mais importantes eventos ocorridos no Maranhão: A luta pela independência e a revolta da Balaiada. E são esses dois episódios que deveriam ser contados naquele rico espaço físico e de memória. Deveria, pois o Memorial exalta a Balaiada e seus personagens, mas ausenta a história pela luta da independência. Além disso, na falta de outros museus na cidade, o local abriga objetos históricos de grande valor para nossa cidade, mas que estão fora do contexto dos dois eventos já citados.

Um museu não é o suficiente para contar a história de um local, ainda mais nossa Caxias. Teresina, nossa quase vizinha, tem cerca de dez museus. A capital São Luís, tirando o seu belíssimo centro histórico, tem pelo menos o dobro de museus da capital piauiense. Cidades localizadas no interior também tem grandes números de museus e espaços culturais. Sobral no Ceará tem quase o mesmo número desses espaços do que a capital Teresina. Oeiras no sertão piauiense, que tem centro histórico ricamente preservado e com alguns imóveis protegidos sob as normas do IPHAN, tem museus em suas igrejas e casarões. No interior maranhense, Alcântara de rico acervo que encanta com seu imponente casario, pavimento adornado em pedras de cores diferentes, ruinas, igrejas e uma bela vista do mar, conta com dois museus abertos a visitação. E a cidade de Pindaré Mirim teve o seu antigo Engenho Central (que teve como um dos proprietários o caxiense Candido Ribeiro) totalmente restaurado e revitalizado pelo IPHAN. Um prédio reconhecido como Patrimônio Histórico Nacional desde 1998, enquanto Caxias não tem nenhum.

Na ausência de mais espaços culturais em nossa cidade, duas instituições acabam absorvendo esse vazio que nos cerca. A Academia Caxiense de Letras vai muito além de uma instituição de homens de letras. O seu espaço físico abriga biblioteca aberta ao público, guarda objetos de valor cultural e ainda recebe atrações de companhias de teatro e eventos, pois o Teatro Fênix, resta apenas uma parede em ruinas. A ACL ainda abriga um espaço de objetos pessoais de um de seus fundadores, o poeta Gentil Meneses, em exposição permanente em seu salão principal. Já o Instituto Histórico e Geográfico de Caxias, além de zelar pelos documentos históricos da cidade, mantem também seu acervo de objetos que pertenceram a políticos e comerciantes. Uma das peças mais preciosas é uma carta do poeta Gonçalves Dias e o livro de atas da Câmara Municipal onde está escrita a famosa rendição da cidade em 1823. Cito ainda uma terceira instituição, o Centro de Folclore e Artes Culturais – CEFOL, em que seu fundador e presidente, o arquiteto e ativista cultural Antônio Nascimento Cruz, vez ou outra faz exposição de objetos de danças folclóricas de Caxias em sua sede, entre as ruinas da primeira estação ferroviária do Maranhão, as margens do Rio Itapecuru.

Objetos históricos pertencentes a famílias de Caxias em exposição no IHGC em 2018.

Propostas para novos museus

Em 2018, quando o novo bispo da Diocese de Caxias, Dom Sebastião Lima Duarte, visitou as dependências da Academia Caxiense de Letras, recebeu de seus membros uma proposta de criação para o Museu de Arte Religiosa de Caxias. Ideia desenvolvida ainda nos tempos do seu antecessor, Dom Vilsom Basso, pelo autor deste artigo. O museu ficaria nas laterais superiores da Igreja Catedral (local chamado de Tribuna), onde contaria a história da ICAR em Caxias e usaria o seu próprio acervo em exposição permanente.

Dom Sebastião, com os acadêmicos Eziquio Barros e Renato Meneses na ACL, sendo apresentando a proposta

de criação do Museu de artes sacras de Caxias.

 

Maquete eletrônica mostrando parte do acervo sacro do século XIX.

Além de um museu para contar a história da Igreja na cidade, expondo seu rico acervo oriundo da Europa do século 19 que estão espalhados pelas igrejas e que alguns estão escondidos dos olhos de fieis, Caxias deveria ter diversos outros museus com seus diversos temas. A ‘cidade dos poetas’ merecia ter um Museu dedicado a poesia. A cidade pioneira no Maranhão na industrialização deveria ter seu museu dedicado a indústria. De artistas como Celso Antônio, Mundico Santos e Tita do Rego, merecia ter um museu dedicado as artes da pintura e escultura.

A cidade está perdendo oportunidades cada vez mais difíceis com o passar do tempo. Objetos de famílias tradicionais, que poderiam ajudar a contar a história de Caxias, estão saindo da cidade através de espólios de seus descendentes que residem fora. Ainda é possível encontrar muita coisa, porem muitos de seus proprietários que residem na cidade estão em idade avançada e em breve, infelizmente, terá o destino de muitos que se perderam, sendo encontrados possivelmente em antiquários pelo Brasil.

É necessário criar uma ‘força tarefa’ para catalogar esses objetos, ir atrás de outros para serem repatriados a Caxias. E claro, um novo espaço destinado ao ‘Museu da Cidade de Caxias’.

Com essa proposta de criação deste museu, não existe espaço mais adequado para abrigar e receber exposições do que o Centro de Cultura, imponente prédio do parque fabril do fim do século XIX. Prédio que merecia passar por uma verdadeira transformação física, removendo salas governamentais que lá se encontram e dar a ele o verdadeiro sentido de um centro cultural. Assim a cidade poderia dar entrada junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, para que se torne mais um Bem de Patrimônio Nacional no Maranhão – e o primeiro de Caxias – e assim, receberia recursos de projetos de revitalização.

Uma vez transformado o novo Centro de Cultura, abrigaria diversas salas dedicadas a caxienses: Sala Celso Antônio (Com obras do artista que são possíveis de serem adquiridas com colecionadores), Sala Mundico Santos (também com obras do artista) e Sala dos Poetas. É possível adquirir livros e documentos de Coelho Neto nas mãos de colecionadores e cito um deles, o nosso Edmilson Sanches. Além de objetos pessoais que ainda se encontram na sua antiga residência nas Laranjeiras no Rio de Janeiro, mantidos pela sua família. Além de claro, de muitos outros poetas que ainda existem guardados com um ou outro admirador. Sala da Industria que contaria a vida de Francisco Dias Carneiro e o parque industrial. No Engenho D’agua ainda existem partes da fábrica espalhados no meio do mato. Na antiga Refinaria, fundada por Alderico Silva, ainda tem as partes do maquinário de extração do óleo de babaçu.

Outro espaço que deveria passar pelo mesmo processo é o já citado onde foi a primeira estação ferroviária do Maranhão, onde atualmente funciona a CEFOL. Um lugar para abrigar as artes populares com sua área revitalizada, os trilhos de volta para mostrar o período da maria fumaça. Ali também é possível encontrar curiosidades daquela época, além de parte das ferragens da oficina dos trens.

Se nada for feito agora, essas peças já deterioradas se perderão para sempre.

Partes da antiga fábrica da família Castelo Branco da Cruz, no Engenho D’agua. Peças que deveriam estar em exposição,

estão jogadas no meio do sol e chuva.

É hora de retomar essa ideia no campo cultural. Da ‘Manchester maranhense’ que Caxias foi no período industrial, quem sabe agora seja a ‘Florença maranhense’ no que diz respeito ao campo das artes e culturas, em alusão a Florença, na Itália. Cidade essa rica pela sua beleza e cultura e, principalmente, pelo zelo de suas artes. Assim, nossa matéria prima teria o destino final que tanto merece.


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