Quando eu era garoto em Caxias pela década de 90, ouvi a história de um político piauiense que tinha como proposta de campanha nas eleições municipais, pintar o asfalto de Teresina de branco para amenizar o calor da capital. A ideia parecia estapafúrdia e por muito tempo alimentou o folclore político de promessas hilárias e absurdas.
Era o engenheiro Alberto Tavares Silva. Prefeito de sua cidade natal Parnaíba por duas vezes, Governador e Senador também por duas vezes, além de Deputado Estadual e Federal. À frente do Governo do Estado desenvolveu a malha viária do Piauí, ligou cidades, incentivou o turismo piauiense com a criação da PIEMTUR (Empresa Piauiense de Turismo), criou o Parque Zoo botânico, construiu a nova rodoviária em Teresina, o estádio de futebol ‘Albertão’, implantou a Universidade Federal do Piauí, construiu o parque aquático Potycabana, e a linha de metrô da capital. Mas nunca foi eleito prefeito da capital.
Alberto Silva não era nenhum aventureiro com ideias mirabolantes e populistas. Longe disso. A ideia de pintar o asfalto da capital, dando aquele tom estranho as ruas e avenidas, com certeza viraria anedota no meio político por muito tempo – como de fato virou. Não seria qualquer político a apresentar uma ideia dessas. Mas sua formação em engenharia civil, sua experiência na área da construção, assumindo diversos cargos nesse setor antes de entrar na política o fez ter certeza que isso ajudaria a amenizar a temperatura da cidade.
Usar a cor branca no telhado de uma residência é comum nas construções. Principalmente quando abandonamos o telhado cerâmico e seu alto pé direito, herdado da arquitetura colonial do século XIX (que dá um maior conforto térmico), para adotarmos a laje de concreto. O branco ajuda a refletir com maior facilidade os raios solares fazendo com que a temperatura de um ambiente interno seja mais agradável e ainda se economizando o uso de energia elétrica.
O que me fez lembrar dessa história de garoto foi a reportagem recentemente veiculada de que a cidade americana de Los Angeles está pintando o asfalto de um cinza claro para amenizar as ondas de calor que afetam a região sul do estado americano da Califórnia.
Chama-se CoolSeal, uma espécie de tinta produzida pela indústria bélica que servia para camuflar aviões de satélites espiões. O produto que reflete os raios solares foi aperfeiçoado para servir em áreas civis, como as ruas. Os técnicos descobriram que em vias pintadas a temperatura chega a ficar 9º mais frescos do que em áreas asfaltadas sem sombras nas proximidades. Aplicada em grande escala pela área urbana, a temperatura da cidade pode cair até 2º Celsius.
O asfalto é um grande acumulador de calor. Durante o dia a camada asfáltica absolve o calor dos raios solares e o libera até mesmo tarde da noite. Isso faz com que a sensação térmica nessas proximidades continuem em alta temperatura.
Mas nós caxienses fomos ensinados por nossos governantes de que o asfalto é a modernidade. Seria o oposto de uma área rural. Ter asfalto na rua é um status social, é inclusão social. É uma forma de dar a rua a vitalidade urbana necessária para a valorização do imóvel.
Enquanto Alberto Silva tentava amenizar o calor de Teresina, aqui nós asfaltávamos com muito orgulho as nossas vias em pedra e paralelepípedo do centro histórico. Era a modernidade chegando na terra de Gonçalves Dias. As portas abertas para a cidade receber o século XXI, deixando de lado tudo que se acreditava ser um empecilho para o seu desenvolvimento, relegando o seu passado histórico e ignorando o planejamento urbano.
Caxias está localizada na região mais quente do Brasil que é o nordeste, onde sua zona urbana está em uma ‘ilha de calor’, cercada por morros. Não temos como fugir do calor, mas podemos buscar meios de amenizar as altas temperaturas e a sensação térmica que é ainda maior. Existem soluções para amenizar parte do problema, antes de gastarmos verbas importando tintas e abrindo licitações para empresas explorarem o serviço.
O mais prático seria um plano de arborização nas vias para sombreamento de avenidas e vias de grande tráfego. A sombra refresca uma área consideravelmente, pois filtra a incidência de raios solares no asfalto, ajudando no conforto térmico de pedestres e ciclistas.
Vias de trafego locais ou secundárias (vias de distribuição de bairros residenciais de menor circulação de veículos) poderiam ser de paralelepípedo ou de material que permita a penetração da agua no solo em maior porcentagem, como bloquetes.
A lei de Zoneamento e Uso e Ocupação do Solo, com um Plano Diretor atualizado nessas questões, são instrumentos que auxiliam o Poder Público a desenvolver a cidade de forma responsável. São leis e normas que dão responsabilidades a proprietários de terrenos e imóveis a controlar a construção, evitando que a área construída seja acima da permitida (evitando maior impermeabilização do solo).
Isso faz com que o vento circule de forma equilibrada pela cidade, a agua escorra com maior penetração no solo, o sistema viário seja distribuídos de acordo com as necessidades produzindo menos poluição.
Quem sabe agora a ideia de Alberto Silva, o pintor de aslfalto, não seja estupida como achavam na época.
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